o último salto
ninguém, estranho
neologismo, cuidou de não ser visto ao sair de casa no seu último dia. todo contente, corria silencioso - não, não poderiam percebê-lo. este era o seu último amanhecer, seus últimos suspiros, nesta terra que era de todos, menos dele, menos de ninguém... foi até a ponte no centro da cidade. era cedo, poucos carros passavam e seus donos, sonolentos, certamente não o viram. preparou-se para o salto fatal. estava decidido. mais do que isso: estava feliz por ter decidido. tomou fôlego (o
último, pensou) e saltou ponte abaixo. mas não morreu. acordou numa maca no corredor de um hospital público, no meio de dezenas de anônimos. durante o dia todo nenhum médico ou enfermeira apareceu. ficou lá sem entender como ali havia chegado. chorou uma lágrima um pouco antes de
pegar no sono.
:marcos ramon
basta o sonho para lembrar-mos que o tempo é sempre o mesmo. pessoas que andam com as mesmas companhias. carros que seguem os mesmos traçados. e no meio disso tudo fingimos que não reparamos e cremos que a vida segue, que o dia passa, que o amanhã será diferente, que o nosso
ordem e progresso ainda pode significar alguma coisa...
:marcos ramon
OLHEIRAS
nunca um dia foi tão breve. então
pensar em círculos é a melhor opção. o sonho não vem a ser recomendável nestes momentos. por isso é que diz-se dos sonhadores que todos vivem no mundo da lua. lá não há brevidade. apenas constância, ininterrupta inércia. e quem discordar que vá à lua e tente sonhar com um dia mais belo. voltará com olheiras.
:marcos ramon