segunda-feira, novembro 25, 2002



mas aqui é diferente. peça licença.
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A DESTRUIÇÃO DO EFÊMERO



Este ano tive a felicidade de presenciar mais uma vez a “Mostra Maranhense de Arte Efêmera” organizado pelo DAC/UFMA, que chegou em sua sexta edição. E digo “felicidade” porque a cada edição desta “mostra” percebo que estou mais certo: ela não deveria mais existir; talvez ela não devesse nem ter sido criada. Certamente aqueles que participam assiduamente, assim como os organizadores, devem estar achando petulância demais da minha parte julgar tão mal esta “manifestação artística”. Para estes, principalmente, seguem então alguns esclarecimentos que faço com equilíbrio de julgamento (tanto quanto possível!) sobre a dita “mostra”.

Em primeiro lugar, claro que são louváveis as tentativas de incentivo a algum tipo de produção artística em nossa cidade (na pintura, literatura, teatro, música, etc.), mas cabe também analisar a coerência de tais tentativas. Senão vejamos, a mencionada “mostra”, que já está na sua sexta edição, chama-se “Mostra de Arte Efêmera”. Ora, existe aqui claramente uma contradição (no pior sentido do termo) e muitos, com certeza, irão concordar comigo: que “arte” é essa que pretende ser “efêmera”? Se os defensores dessa “mostra” acreditam ser a Arte, em primeiro lugar, a beleza ou a criação, lembro aqui que estão enganados. A Arte, antes de ser a beleza ou o ato da criação, é a revelação do Ser, como já dizia Heidegger. Mas, de outra forma, ainda que encarássemos a Arte daquela maneira, a “mostra” não sairia de sua contradição: primeiro porque beleza (nessa “mostra de arte efêmera”) não há; e segundo, o processo de criação das “obras” é altamente discutível. Na obra de Arte o Ser se manifesta, toma o seu lugar. Não que o importante da Arte se encontre no objeto fabricado ou mesmo na aparente qualidade daquele objeto. O importante na Arte é a necessidade incondicionada que ela traz consigo, a necessidade de manifestar, de mundificar aquele instante. Só no seu absoluto, no seu incondicionado, é que a Arte pode alcançar a sua plenitude. Como então encontrar isso no efêmero? O efêmero, o momentâneo, pode enraizar-se como Arte, no sentido mais estrito do termo? Claro que não. Ser é durar, é permanecer. A existência humana é uma luta para durar mais e mais (o sonho da fonte da juventude...). A Arte, a real Arte, não é menos que isso: é justamente essa duração.

Talvez (e isso é somente talvez) os organizadores e participantes da “Mostra Maranhense de Arte Efêmera” sejam platônicos e se utilizem do discípulo de Sócrates para afirmar que a Arte é simplesmente imitação, mímesis, e portanto é apenas uma conformidade. Mas antes de aderirmos a esta sedutora concepção é preciso lembrar-nos de Nietzsche. Os únicos valores que o pensador alemão, autor da “Origem da Tragédia no Espírito da Música”, realmente considerava eram os estéticos e isso porque a beleza pode realmente carregar consigo a verdade. A Arte não é mera imitação de paisagens, de fatos, de olhares. A Arte põe em obra a verdade. A obra de Arte traz a verdade dos cabelos da Dânae de Klimt, do mundo dos Girassóis de Van Gogh, da incerteza do Toureiro Alucinógeno de Dalí. Estes pintores se utilizavam da tinta, mas certamente não a “gastavam”. Assim como os bons escultores não “gastam” a pedra e os bons músicos não “gastam” o som. Na obra de um poeta como Rimbaud (ou Pessoa, ou Nauro...) não encontramos palavras “gastas”, pelo contrário. Ali a palavra atinge a sua verdade. A obra de Arte, amigos efêmeros, é aquilo que conserva.

Se querem manter a “mostra”, que mantenham, mas sejam ao menos coerentes: ao invés de destruir a Arte, destruam o efêmero. Por que não mudar o título para “Mostra Maranhense de Efemeridades”? Afinal de contas a Arte não precisa sofrer com apelos como fezes dentro de um prato ou um monte de cabelos no meio do chão. Duchamp, pra quem não sabe, estava sendo irônico ao colocar um mictório em exposição. Mas aqui em nossa Ilha ironia não existe. Existe sim uma incrível (e humilhante) pretensão de seriedade.


Marcos Ramon
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terça-feira, novembro 19, 2002

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“Um pedaço de coisa.
Um pedaço de ferro, uma antena de barata, uma caliça de parede.
Minha exaustão se prostava aos pés do pedaço de coisa adorando infernalmente. O segredo da força era a força, o segredo do amor era o amor – a jóia do mundo é um pedaço opaco de coisa”.
*A Paixão Segundo G. H. / Clarice Lispector*


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quinta-feira, novembro 14, 2002

O antiprofeta



"Em todo homem dorme um profeta, e quando ele acorda há um pouco mais de mal no mundo...
A loucura de pregar está tão enraizada em nós que emerge de profundidades desconhecidas ao instinto de conservação. Cada um espera seu momento para propor algo: não importa o quê. Tem uma voz: isto basta. Pagamos caro não ser surdos nem mudos...

O homem idealmente lúcido, logo idealmente normal, não deveria ter nenhum recurso além do nada que está nele... Parece que o ouço: "Livre do fim, de todos os fins, de meus desejos e de minhas amarguras só conservo as fórmulas. Tendo resistido à tentação de concluir, venci o espírito, como venci a vida pelo horror, a buscar-lhe uma solução. O espetáculo do homem - que vomitivo! O amor - um encontro de duas salivas... Todos os sentimentos extraem seu absoluto da miséria das glândulas. Não há nobreza senão na negação da existência, em um sorriso que domina paisagens aniquiladas.

(Outrora tive um "eu"; agora sou apenas um objeto... Empanturro-me de todas as drogas da solidão; as do mundo foram fracas demais para me fazer esquecê-lo. Tendo matado o profeta em mim, como terei ainda um lugar entre os homens?)"

E. M. Cioran
fonte:http://www.pgr.mpf.gov.br/~ezio/textos.html
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"Como o burrico mourejando à nora,
A mente humana sempre as mesmas voltas dá...
Tolice alguma nos acorrerá
Que não a tenha dito um sábio grego outrora..."

* Do exercício da filosofia / Mário Quintana
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adão e eva - gustav klimt
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segunda-feira, novembro 11, 2002

Fábula Curta - Franz Kafka



"Ai de mim!", disse o rato, " - o mundo vai ficando dia a dia mais estreito" .


"- Outrora, tão grande era que ganhei medo e corri, corri até que finalmente fiquei contente por ver aparecerem muros de ambos os lados do horizonte, mas estes altos muros correm tão rapidamente um ao encontro do outro que eis-me já no fim do percurso, vendo ao fundo a ratoeira em que irei cair".


"- Mas o que tens a fazer é mudar de direção", disse o gato, devorando-o.



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segunda-feira, novembro 04, 2002

vida no espaço-tempo


a vida humana encontra seu contra-senso na sociedade. “mas como!”, podem dizer os mais inteligentes, “o ser humano é um ser bio-psico-social. a sociedade é onde o indivíduo se fundamenta. sem sociedade não existe ser humano existem animais apenas”. sim, existem animais apenas. e não é muito mais do que somos. formigas conhecem os limites de suas organizações, leões travam a boa luta contra suas presas, aves contemplam o mundo que nós insistimos em destruir, seres humanos roubam e matam por pedaços de papel. a sociedade destrói o que há de humano na humanidade. mas pensando bem, os inteligentes estão certos, a vida humana encontra-se ligada à sociedade, ou então seríamos apenas animais... muito, talvez, para a pequeneza de nosso egoísmo natural.

marcos ramon

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Local: Brasília, DF, Brazil

Professor de filosofia, pesquisa estética e cibercultura.

reúno fragmentos espalhados em cada vão renunciado

anti-nada eu escrevo o que me vem na telha


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